Até que ponto o Brasil, com tantos problemas internos, tem condições de oferecer ajuda para além de suas fronteiras? A pergunta tem sido feita por analistas dentro e fora do país. Recentemente, dado divulgado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) alimentou ainda mais a discussão. A OMS mostrou que o governo brasileiro gasta apenas 6,1% do orçamento em saúde, abaixo da média dos países da África (9,6%), do Haiti (9,5%) e do resto do mundo (13,9%).
Numa das demonstrações mais recentes, o Brasil anunciou que irá doar à Central Internacional para Compra de Medicamentos (Unitaid) dois dólares americanos por passageiro que viajar de avião ao exterior. A autorização de contribuição está prevista em lei sancionada pela presidenta Dilma Rousseff.
Para o economista, professor de relações internacionais do Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH), Alexandre Leite, notícias de ajuda para países pobres ou em crise podem causar revolta nos brasileiros porque eles sentem na pele, dentro do país, os resultados de um orçamento mal administrado que destina mais verbas para campanhas publicitárias do governo, por exemplo, do que para a saúde e a educação. “A realidade demonstra que temos muitos lapsos, muitos espaços vazios no Brasil a serem preenchidos por um Estado. Eu costumo dizer que o Brasil ainda precisa ter o ‘Estado mínimo’,” afirma.
O estudioso reconhece que o governo brasileiro tem exagerado, em alguns momentos, e vendido para o mundo uma imagem falsa. “A gente dá uma ideia de que temos condições de auxiliar para além do que efectivamente conseguiríamos. Em alguns momentos, fazemos esforços para ajudar alguns países no sector externo com políticas que poderiam ser muito úteis internamente. Recentemente, o Brasil enviou tropas para o Haiti, mas existem comunidades no Brasil, principalmente nas fronteiras, onde existe a necessidade de um processo muito semelhante. As nossas fronteiras com a Bolívia, o Uruguai, parte da Amazónia estão completamente desprotegidas. Esse mesmo esforço poderia ser feito nesses locais.”
Alexandre Leite analisa que as decisões de política externa do Brasil fazem parte de um projecto brasileiro por conquista de interesses maiores no cenário global. “O Brasil, sendo um país reconhecido como um doador internacional, que tem disponibilidade para auxiliar no momento de alguma catástrofe, passa a ser melhor visto fora das fronteiras, explica. “Diante de objectivos mais avançados da política externa, como posição no Conselho de Segurança da ONU, isso pode no futuro fazer parte de uma decisão futura desses membros. O Brasil seria visto como um país que teria condições, potencialidades para fazer parte do Conselho de Segurança,” completa.
O grande problema é que, segundo o analista, com vistas a dar voos mais altos, o governo brasileiro pode estar olhando demais para fora. “O que eu vejo hoje é o Brasil querendo aparecer de uma forma mais activa. Na história recente não temos visto países fazendo esforços tão grandes quanto o Brasil vem fazendo hoje dentro do cenário internacional, mais do que os outros países que são semelhantes.”