Os antigos comandantes do Exército e da Força Aérea do Brasil apontaram em declarações à Polícia Federal (PF) o antigo Presidente Jair Bolsonaro como tendo dirigido pessoalmente reuniões e feito pressões para dar um golpe militar no país, depois da derrota nas eleições de 2021.
O então comandante da Força Aérea, Carlos de Almeida Baptista Jr., afirmou em depoimento que "numa das reuniões dos comandantes das Forças com o então Presidente após o segundo turno das eleições, depois de o presidente da República, Jair Bolsonaro, aventar a hipótese de atentar contra o regime democrático, o então comandante do Exército, general Freire Gomes, afirmou que caso tentasse tal ato teria que prender o Presidente da República".
Estes depoimentos vieram a público nesta sexta-feira, 15, depois do juiz do Supremo Tribunal de Justiça ter levantado o sigilio dos mesmos.
De acordo com as atas da PF, o ex-comandante relatou ter deixado evidente que não participaria em nenhum plano golpista e que não haveria qualquer hipótese de Bolsonaro permanecer no cargo.
Comandantes disseram que FA estariam fora de qualquer golpe
Ele também contou que "ouviu" sobre a existência de uma ordem para atrasar a divulgação de um relatório, feito pelo Ministério da Defesa, que atestava a lisura das urnas eletrónicas, nas eleições de 2022.
Durante as investigações, a PF encontrou dois documentos que teriam sido discutidos por integrantes do núcleo do Governo.
Por seu lado, o ex-comandante do Exército, Freire Gomes, disse à PF, no dia 1 de março, como testemunha, que se negou a participar do golpe, apesar da forte pressão sofrida para aderir ao plano.
Freire Gomes esteve presente em duas reuniões em que Jair Bolsonaro, militares, ministros e assessores dele discutiram a proposta do golpe, nomeadamente um decreto.
A 7 de dezembro de 2022, uma versão do documento que previa o "estado de sítio dentro das quatro linhas" foi apresentada por militares e noutro encontro em que uma outra versão do documento foi apresentada ao então Presidente Bolsonaro com os três comandantes.
A ata da PF narra que Freire Gomes "respondeu que se recorda de ter participado de reuniões no Palácio do Alvorada, após a segunda volta das eleições, em que o então Presidente da República Jair Bolsonaro apresentou hipóteses de utilização de institutos jurídicos como GLO, Estado de Defesa e Estado de Sítio em relação ao processo eleitoral e que sempre deixou evidenciado ao então Presidente da República Jair Bolsonaro, que o Exército não participaria na implementação desses institutos jurídicos visando reverter o processo eleitoral.
Ataques contra os comandantes e o "esboço do golpe"
Ante a sua oposição, o então comandante do Exército confirmou ter sofrido ataques de apoiantes do ex-Presidente envolvidos no caso, incluindo o ex-ministro da Defesa, general Braga Netto.
Ainda segundo a PF, a 14 de dezembro, uma semana após Freire Gomes negar participar do golpe de Estado, Braga Netto trocou mensagens com o militar da reserva, Ailton Gonçalves Moraes Barros, classificando a postura do comandante como uma “omissão” e uma “indecisão”.
Dos três ramos das Forças Armadas, apenas o comandante da Marinha, Almir Garnier, admitiu numa reunião que colocar os seus homens nas ruas caso Bolsonaro decretasse golpe militar.
Apesar de muitas denúncias e críticas de que havia a intenção do Presidente e seus aliados incitarem a um golpe militar, só em em janeiro de 2023, a PF viria a encontrar na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres o esboço de um decreto para instaurar Estado de Defesa na sede Tribunal Superior Eleitoral (TSE), presidido pelo juiz Alexandre de Moraes.
O documento dizia que o objetivo era apurar suposto abuso de poder e "medidas inconstitucionais e ilegais" tomadas pela então Presidência e membros do tribunal.
O decreto previa ainda a quebra do sigilo dos juízes e a criação de uma Comissão de Regularidade Eleitoral para investigar os atos do TSE.
Documento no gabinete do ex-Presidente
Em junho de 2023, a PF encontrou um documento no telemóvel do então ajudante de campo de Bolsonaro Mauro Cid que sustenta que a ruptura do Estado Democrático de Direito estaria “dentro das quatro linhas da Constituição”.
O texto propunha a declara o estabelecimento de Estado de Sítio e, posteriormente, uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), que permite ao Presidente da República convocar operação militar em graves situações de perturbação da ordem.
Em fevereiro deste ano, a PF encontrou no escritório de Bolsonaro dentro da sede do seu partido, o PL, em Brasília, um documento semelhante ao apreendido no telemóvel de Mauro Cid.
O antigo Presidente ainda não reagiu a estas novas acsações, mas sempre negou ter tentado um golpe de Estado nos dias seguintes à sua derrota eleitoral, que ele nunca admitiu.
Ele viajou para os Estados Unidos, no dia de dezembro, para evitar entregar a faixa presidencial ao Presidente eleito, Lula da Silva, a 1 de Janeiro de 2022.
Dias depois, os seus apoiantes invadiram edifícios governamentais em Brasilia.
C/Reuters
Fórum