O novo modelo para uma Reserva Estratégia Alimentar (REA) em Angola, com o Entreposto Aduaneiro na gestão, pode esbarrar na falta de transparência em programas de apoio à classe camponesa, actualmente sem sementes para a produção de grãos e outros bens, disseram à VOA produtores e agentes comunitários.
A estratégia do Governo angolano, que rescindiu com o Grupo Carrinho antes mesmo da data prevista para o fim do contrato, alegando gastos avultados com a importação, prevê 500 mil milhões de Kwanzas para o fomento à produção interna, mas nem isso remove o cepticismo.
Nesta quarta-feira, 10, o ministro da Indústria e Comércio, Rui Miguens, disse que os anteriores moldes da Reserva Estratégica, concebida numa perspectiva de segurança alimentar, davam lugar a passivos não previstos nas contas públicas.
A importação dos 11 produtos eleitos, com realce para as carnes, arroz, açúcar, farinha de milho, feijão e óleo alimentar, arrancou com 200 milhões de dólares, mas esse valor foi subindo, sobretudo devido à necessidade de construção e reabilitação de armazéns para o acondicionamento dos alimentos.
Levantamentos feitos pela VOA indicam que o novo gesto do programa, Entreposto Aduaneiro, uma entidade pública em reestruturação devido à falência técnica, recebeu já as infra-estruturas antes ao serviço da Carrinho, mas não é líquido que possa adquirir a produção a camponeses nacionais.
Numa análise ao quadro vigente no país, o produtor José Cabral Sande ressalta estrangulamentos como a falta de sementes para o pouco fertilizante existente e sublinha que nada vai mudar sem o trabalho de casa da parte do Governo.
“No local onde estou há uma reserva de fertilizantes mas não temos sementes de milho e outros grãos para lançar à terra{, disse.
Agora, tiram a Carrinho, mas vão injectar dinheiro no Entreposto, vão na mesma importar aquilo que disseram que nunca mais importariam”, vaticina Sande.
Aquele produtor diz não ter dúvidas de que “vão fazer de contas que estamos a produzir, isto porque ainda não deram os 500 mil milhões, ainda ninguém foi ao campo ver o que se faz, e já querem falar deste modelo de gestão da Reserva”.
Recentemente, na província do Kwanza Sul, o próprio ministro da Agricultura e Florestas, António Francisco de Assis, assumiu que as sementes, os adubos e os instrumentos de trabalho não chegam a comunas e municípios onde há alguma produção.
Anunciados os mais de 603 milhões de dólares (500 mil milhões de Kwanzas) para a capitalização de fundos agrários, o técnico Justino Figueiredo, assistente de projectos na Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), pede lisura na assistência às cooperativas e associações.
“Isto através dos créditos, tudo de forma justa, a entrega àquelas pessoas que, em nosso entender, estão em vulnerabilidade mas com capacidade reconhecida para produzir”, afirmou, acrescentando que “portanto, os critérios de acesso devem ser justos, obedecendo o princípio da equidade ou igualdade”.
O economista e agente comunitário Abílio Sanjaia, que defende actividade intensa em todo o território e assistência técnica a favor dos homens do campo, adverte que a intervenção do gestor da Reserva Estratégica Alimentar deve ter em conta interesses do produtor e do consumidor
“Então deve comprar o excesso, isto para garantir que o preço da Reserva tenha em conta os custos médios de produção e o produtor, por sua vez, não pode vender a um preço tão elevado, aí entra a REA para influenciar, introduzindo no mercado a preços não tão elevados”, explica o agente.
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