O exercício da actividade jornalística e as suas incompatibilidades tem sido motivo para acesos debates no seio da classe jornalística desde a publicação de decreto presidencial que proíbe o exercício desta actividade em simultâneo com a de assessor de imprensa, consultor de comunicação e imagem.
A proibição vem expressa no decreto presidencial nº 230\15, divulgado em Janeiro deste ano, que cria o Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa nos governos provínciais e em departamentos ministeriais.
De acordo com o decreto, os técnicos do Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa passam a ser equiparados a funcionários e agentes do Estado.
O Sindicato dos Jornalistas Angolanos aplaude a publicação do decreto, mas ressalta que nada traz de novo quanto o exercício incompatível do jornalismo com a actividade profissional de assessor de imprensa.
Teixeira Cândido, Secretário desta organização sindical, afirma que o documento deverá reorganizar algumas questões de ética na classe, embora as incompatibilidades têm acontecido sob uma alegada conivência dos directores dos órgãos de comunicação social.
O sindicalista chama atenção para a autorregulação e auto-responsabilização anível da classe jornalística dada a ausência da carteira profissional que seria,na sua visão, o mecanismo mais eficaz para “castigar” os errantes.
Para o jornalistae antigo líder sindical, Ismael Mateus, a regulação das matérias relativas as competências dos jornalistas deve ser autorregualada pela própria classe. O profissional chama atenção para o dever de imparcialidade no exercício da profissão, sobretudo para aqueles que se encontram “em sentido contrário” ao código de ética e deontologia, bem como ao referido decreto presidencial que regula a actividade profissional neste domínio.
«Estamos a falar ao nível do que é desejável, estamos a falar ao nível dos princípios éticos da classe, no dia-a-dia as coisas são difíceis para isto nós temos que encontrar defesas», disse.
Sobre a autorregulação, Teixeira Cândido refere que existem jornalistas angolanos que não estão comprometidos com os princípios éticos e deontológicos tendo, no entanto, assegurado que deve existir um mecanismo que os obrigue o cumprimento da lei.Para o actual Secretário Geral do SJA este mecanismo que pode regular os atropelos da profissão chama-se Carteira Profissional.
«Para estas pessoas precisa haver um mecanismo que os obriga a cumprir: Deixando a profissão ou cumprir com aquilo que são os valores da profissão e este mecanismo deve ser a carteira profissional», defendeu o jornalista que falava durante um debate a propósito do estado da comunicação social angolana promovido por uma televisão privada: TV-Zimbo.
Para aquele profissional,não satisfazao Sindicato dos Jornalistas Angolanos a existência de mecanismos para se fazer cumprir quer a deontologia quer o estatuto, porém a realidade actual faz crer o contrário.
Em Janeiro deste ano o Presidente da República nomeou os membros dos Conselhos de Administração de alguns órgãos de informação do Estado. Entre os nomeados constam jornalistas em pleno exercício da profissão. Mas a questão que se coloca é se estes deverão ou não continuar a exercer a profissão?
Ismael Mateus, antigo Secretário Geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos, responde esta pergunta defendendo que os membros do Conselho de Administração das empresas públicas ou privadas ligadas de comunicação social “não podem exercer jornalismo, na medida em que pertencem aos órgãos de decisão da instituição”.
Ismael recorda que o SJA defendeu- num passado não muito recente- a criação dos Conselhos de Administração a nível dos órgãos de informação. O objectivo, segundo o jornalista, era fazer a diferença entre “o Conselho de Administração, enquanto órgão de gestão empresarial e os Conselhos de Redacção, os Directores de Informação, os editores enquanto gestores editoriais”, frisou.
Aos quadros que integram o Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa é vedado em absoluto o exercício da profissão de jornalista, bem como atividade de “free lancer”', analista de programas, emissor particular de opiniões, colaboração ou participação como efetivo de qualquer debate e tratamento de matérias jornalísticas ", lê-se no mesmo decreto assinado pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos.
Rui Vasco Director Nacional da Informação entende a nomeação para um cargo de gestor ou administrador de um órgão de informação pressupõe aceitar as limitações impostas por força do perfil adequado a função, que por ser de responsabilidade política é incompatível ao exercício do jornalismo.
«O decreto presidencial não diz que os jornalistas não podem fazer aquilo, porque o que os jornalistas não podem fazer está no estatuto dos jornalistas. Este é um documento específico que estáa fazer a legislação sobre o Gabinete de Comunicação Institucional dos institutos públicos».
O Conselho Nacional de Comunicação Social e o pacote de leis ligadas a imprensa, que terá sido engavetado na Assembleia Nacional, poriam termo as incompatibilidades no exercício da actividades jornalística. Alexandre Solombe, Presidente do Conselho de Governadores do Instituto de Comunicação Social da África Austral- MISA-Angola, lamenta o facto de ter sido o Presidente da República a pôr ordem no seio dos jornalistas.
Solombe refere por outro lado que o conteúdo do drecreto presidencial, no que diz respeito as incompatibilidades do jornalismo, já tinha sido debatido por sindicalistas e jornalistas, pelo que questionou as razões por que terá sido o Titular do Poder Executivo a tomar tal decisão.
«Uma vez mais é o Presidente, por acaso, porque ele tem o poder que tem. Mas, os jornalistas bateram-se para que estas incompatibilidades tivessem fim. A pergunta que eu faço é: Por que é que só tem de ser o Presidente a tomar esta decisão?», questionou.
Na visão do jornalista Ismael Mateus a questão das incompatibilidades está ligada a Carteira Profissional e à falta de vontade política do Executivo.
O profissional que falava durante uma palestra sobre as “Incompatibilidades no exercício do jornalismo. Limitações éticas e deontológicas”, promovida pelo Sindicato dos Jornalistas Angolanos, defendeu por outro lado, o reforço do diálogo com as autoridades e a contestação permanente dos homens do microfone.
Sobre o Conselho Nacional de Comunicação Social, órgão no qual está adstrita a Comissão da Carteira e Ética Profissional, o jornalista a advoga a renovação deste órgão com objectivo de resolver os problemas que dificultam o bom desempenho dos profissionais.
Para Ismael Mateus, que chamou o Conselho Nacional de Comunicação Social de “múmia”- por falta de renovação dos seus membros e das suas directrizes- mais do que fazer leis é importante a mudança de comportamentos e a tomada de “consciência de classe”.
«É preciso dialogar com o próprio Conselho Naccional da Comunicação Social, que nunca mais se renova_que é aquela coisa...Aquilo é uma múmia», disse o jornalista para quem depois da lei de imprensa o decreto presidencial será outro documento a ser desrespeitado.
«Vamos continuar a ver as pessoas a fazerem publicidade vamos continuar a ver administradores a dirigirem jornais, serviços noticiosos. Vamos continuar a ver um conjunto de incompatibilidades que nós vivemos hoje. Temos que fazer pressão e criar a tal consciência de classe», assegurou.
O Comunicação Nacional da Comunicação Social é úm órgão fundamental para o exercício da liberdade de expressão e de imprensa em Angola, dai que Alexandre Solombe diz ser necessário o seu “empoderamento”, para fazer juz aos objectivos da sua criação e estar ao nível de instituições semelhantes a nível internacional.
«Um órgão fundamental de exercício da liberdade de expressão e de imprensa, que é neste caso o CNCS, exerceria se efectivamente tivesse poder. É preciso empoderar este órgão ecoloá-lo a nível das outras entidades a nível internaional, falo por exemplo da Alta Autoridade para omunicação Social»
Em relação á Carteira Profissional o jornalista Ismael Mateus apela o sindicato a não cruzar os braços, pelo que também defende o recurso à pressão internacional para que se resolva o problema.
«Não podemos nos calar, temos que ir à guerra. É preciso não calar, temos que fazer recurso à pressão internacional», sugeriu.