A poucos dias da tomada de posse de João Lourenço como Presidente de Angola, o activista de direitos humanos José Patrocínio disse que a grande incógnita é saber qual será a sua autonomia para governar.
Ao participar no programa “Angola Fala Só”, o coordenador da OMUNGA – uma organização de direitos humanos que opera a partir do Lobito – disse, contudo, que mesmo que ele tenha essa autonomia há questões “em que ele não vai mexer, não vai tocar”.
Uma delas é a possível revisão da Constituição e outra as eleições autárquicas.
“Estou muito ansioso para ver se vai haver passos ou não concretos para que se organizem no mais breve espaço de tempo as autarquias”, disse Patrocínio para quem outra grande dúvida é o combate à corrupção.
“Mesmo com autonomia, mesmo com possibilidades de actuar livremente sem interferências do partido ou de José Eduardo dos Santos, eu tenho algumas dúvidas mas estou com muita expectativa para ver o que vai acontecer”, acrescentou.
Ao afirmar que Angola nunca teve “um verdadeiro processo de reconciliação”, José Patrocínio disse que, tendo em conta as tensões pós eleitorais, isso “é uma das prioridades do país”.
“Não sei se haverá vontade ou energia para se trabalhar nessa questão”, afirmou o coordenador da OMUNGA, que manifestou a sua preocupação em que “o espaço de participação” dos angolanos na cena política angolana “possa ser diminuído”.
“Estou com muita preocupação de que se venha a limitar ainda mais a participação da sociedade civil, a participação dos cidadãos”, acrescentou Patrocínio para quem a tensão vivida durante o processo pós-eleitoral abriu “a possibilidade para uma intervenção maior da ala mais fanática do MPLA”.
“Está tudo em aberto e vamos esperar para ver”, sublinhou
Interrogado por um ouvinte se considerava que os direitos humanos consagrados na Constituição são respeitados, o coordenador da OMUNGA disse que isso acontece algumas vezes e outras não, “mas de uma forma geral não se dá atenção aos direitos humanos, principalmente os direitos sociais”, nomeadamente saúde, educação e emprego.
Os direitos civis continuam muitas vezes a não ser respeitados “mas nos últimos anos a situação dos direitos sociais tem sido um descalabro", continuou Patrocínio.
No que diz respeito às eleições, José Patrocínio disse que no dia das eleições não houve grandes problemas e fez notar o civismo do eleitorado angolano, mas advertiu que os problemas começaram com o registo eleitoral “não tanto na questão de quem devia ou não ter feito o registo mas sim em como se fez”.
A este respeito fez notar que o último censo populacional tinha apontado para “um crescimento enorme da população angolana”, mas isso não foi reflectido no registo eleitoral.
José Patrocínio criticou também a actuação da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) afirmando que lhe cabia também “garantir um ambiente de paz”.
Por isso, a CNE não deveria ter reagido “de forma tão musculada” às alegações de irregularidades, tendo em conta que a população angolana “vive sempre com grande suspeitas em relação ás instituições”.
“Não esperava que a CNE reagisse de uma forma musculada mas que pelo contrário procurasse todas as vias para tentar resolver essas questões de suspeita”, disse.
“Toda a gente ficou com suspeita de que os resultados aprovados e publicados pela CNE não correspondem à vontade das pessoas”, continuou Patrocínio para quem “mesmo o Tribunal Constitucional deveria ter tentado resolver o problema de outra maneira”.
“As instituições têm que começar a pensar mais em não apenas cumprir o que está escrito mas sim na forma de ultrapassar problemas que depois podem acontecer”, sublinhou o activista, advertindo que isso “pode afectar as próximas eleições”.