A decisão do primeiro-ministro da Somália, Mohamed Hussein Roble, de declarar o representante especial da União Africana para o país, embaixador Francisco Caetano Jose Madeira, diplomata moçambicano, de persona non grata e ordenar-lhe que deixasse o país "dentro de 48 horas" já provocou leituras em Maputo, embora o Governo ainda não se tenha pronunciado.
Para especialista em política internacional Wilker Dias está-se perante uma clara violação dos Estatutos de Viena.
“Apenas Chefes de Estado têm a prerrogativa de declarar persona non grata a um embaixador acreditado naquele país ou representante de uma missão diplomática e não o primeiro-ministro porque o primeiro-ministro não se reveste do papel de Chefe de Estado e, segundo a própria Constituição, este papel é do Presidente da República e este procedimento não passou a Farmaajo para a aprovação e isto torna o processo ilegal”, sustenta Wilker Dias.
Roble acusou o embaixador Madeira de "se envolver em actos incompatíveis com o seu estatuto", uma afirmação que para o analista político Yassine Mahomed é pouco clara.
“A questão levantada pelo Governo da Somália não está clara na medida em que se refere a acções incompatíveis como a responsabilidade com a qual o nosso embaixador está na Somália sem que para tal tenha clarificado quais”, comenta Yassine Mahomed, quem sublinha que Francisco Madeira tem uma folha de serviço assinalável na diplomacia africana.
“O nosso ministro Madeira é uma pessoal de qualidade reconhecida ao nível de África e a nível do fórum continental, principalmente pelo trabalho efectivo e bom que teve na questão do Sudão do Sul e não só, é uma das pessoas que Mocambique tem como cartaz da sua diplomacia na transformação de zonas de conflito em zonas de paz em África”, assinala aquele analista.
Clivagens na Somália
Entretanto, a expulsão da Madeira foi imediatamente rejeitada pelo Presidente da Somália, Mohamed Abdullahi Farmaajo, quem lembrou que o Ministério dos Negócios Estrangeiros que trata dos assuntos diplomáticos não informou a Madeira de ter cometido quaisquer actos contra a soberania do país.
Os analistas ouvidos pela VOA consideram que esta decisão é reflexo das clivagens políticas na Somália, onde as eleições estão adiadas há um ano devido a profundas divergências entre Presidente, primeiro-ministro e partidos políticos.
Wilker Dias considera que “a própria União Africana deve tomar uma posição relativamente a isso, se calhar deve haver também uma conversação interna no seio do próprio Executivo porque a Presidência da República da Somália já vem acusando o primeiro-ministro Roble de praticar aquilo que chamamos de abuso de poder”.
Já Yassine Mahomed refera que esta situação “não deixa de ser uma mancha para a diplomacia africana e acredito que a UA, depois deste incidente, seja ele definitivo ou não, terá que tomar uma posição que se entenda ser para o bem do continente”.
O Governo moçambicano ainda não se pronunciou sobre a decisão que afecta o embaixador Francisco Madeira que está na Somália numa missão ao serviço da União Africana, para o qual foi indicada em 2015.
Refira-se que está não é a primeira vez que a Somália toma decisão idêntica, sendo que o assistente de Francisco Madeira, Simon Mulongo foi expulso em Novembro último.