Milosevic, de 64 anos de idade, foi encontrado morto na sua cela em Haia, onde estava a ser julgado há quatro anos sob 60 acusações de crimes de guerra e genocídio. O seu julgamento foi interrompido muitas vezes devido a sua débil saúde resultante de um problema coronário e tensão alta.
Desafiador até a ultima, Milosevic insistiu em auto-representar-se e denunciou o Tribunal da ONU como falso.
Milosevic foi advogado e banqueiro antes de enveredar pela política. Nasceu numa localidade, a leste de Belgrado, onde os seus pais eram professores. Ambos cometeram suicídio. Tornou-se adulto nos princípios dos anos 60 quando o líder da não-alinhada Jugoslávia comunista, o marechal Tito, estava no auge do seu poder.
O antigo diplomata jugoslavo Vladimir Matic, professor de Ciências Políticas na Universidade americana de Clemson, foi colega de Milosevic na Faculdade de Direito de Belgrado.
“Ele era muito ambicioso e enérgico, e diria mesmo, já naquele tempo, ainda um jovem, manipulador e impiedoso.”
Depois de se formar em Direito em 1964, Milosevic aderiu ao partido comunista, e foi subindo gradualmente na hierarquia. Bem parecido e fluente em inglês, Milosevic ocupou vários postos governamentais e em 1983 presidiu um grande banco jugoslavo, mas um ano mais tarde tornou-se líder do partido comunista na capital do país, Belgrado.
Depois da morte deTito em 1980, a Jugoslávia foi governada por uma fraca e rotativa presidência de oito membros, compreendendo os lideres das seis republicas e as duas províncias autónomas do país. Tensões étnicas e religiosas, suprimidas na multi-étnica federação jugoslava sob a liderança de Tito, vieram ao de cima nos anos 80 e a Jugoslávia estagnou, por entre uma hiperinflação e uma cada vez maior fricção entre as suas republicas.
Milosevic tornou-se chefe do partido comunista na Sérvia em 1986. Um ano mais tarde, ganhou proeminência ao exigir que fosse retirada a autonomia à província do Kosovo e aumentados os poderes aos sérvios naquele território de maioria albanesa.
Numa entrevista em 1999, a escritora e perita sobre os Balcãs, Laura Silber, afirmou que o discurso que Milosevic fez no Kosovo nas comemorações da épica derrota militar dos sérvios aos turcos em 1387, catapultou-o para o poder.
“Foi quando ele realmente pôs a maquina a trabalhar para além do aparelho partidário, para tomar o controlo das províncias de VOJVODINA, no norte, e do Kosovo – a província maioritariamente albanesa – a sul. E foi quando ele começou a preparar o terreno para dirigir a antiga Jugoslávia. Porque, o que ele realmente queria, era tornar-se no próximo Jozip Broz Tito."
Em 1989, ano em caiu a Cortina de Ferro, Milosevic tornou-se presidente da Sérvia. Apresentando-se como um nacionalista sérvio de linha dura, o cada vez maior poder de Milosevic fez soar os sinos de alarme através da Jugoslávia.
Em 1991, a Eslovénia e a Croácia declararam a independência, fazendo disparar o inicio do que viriam a ser quase 10 anos da mais barbara guerra vista na Europa desde a Segunda Guerra Mundial, alastrando-se a Bosnia-Herzegovina e mais tarde ao Kosovo.
Vladimir Matic disse que Milosevic não percebeu como é que o fim da guerra fria mudou a política global e implicou o fim da Jugoslávia comunista. Afirmou que as guerras de Milosevic empobreceram a Sérvia e a maior parte da antiga Jugoslávia.
“Em longo prazo, constituirá um legado que levou a Sérvia que em 1990, estava 15 anos a frente dos países da Europa de Leste, a estar talvez agora 15 anos atras daqueles países.”
Enquanto os anos 90 progrediam e as guerras se espalharam da Croácia para a Bosnia-Herzegovina e o Kosovo, o poder de Milosevic ia-se apertando. Durante os seus 12 anos no poder, todas as guerras que iniciou foram perdidas.
Em 1999, quando perto de três meses de bombardeamentos da NATO em defesa dos albaneses do Kosovo, forçou as tropas sérvias a deixarem o Kosovo, Milosevic era acusado de crimes de guerra pelo tribunal das Nações Unidas em Haia.
Em Outubro de 2000, um levantamento popular forçou Milosevic a aceitar a derrota em eleições e um ano mais tarde, um governo democraticamente eleito na Sérvia enviou Milosevic para Haia para ser julgado.
Richard Holbrooke, antigo embaixador dos Estados Unidos na ONU, conhecia bem Milosevic de horas de negociações sobre o acordo de paz de Dayton que pôs fim à guerra na Bosnia. Classificou Milosevic como um “monstro”.
“Ele foi provavelmente o pior líder, para alem dos lideres comunistas, na Europa, desde a Segunda Guerra Mundial. Trezentas mil pessoas morreram, dois milhões e meio ficaram sem as suas casas devido a Slobodan Milosevic. Combateu e perdeu quatro guerras, depois perdeu o seu trabalho, depois a sua liberdade e enviado para Haia e agora terminou os seus dias com um tipo de justiça tosca e incompleta, na sua cela em Haia.”
Milosevic sofria de um problema cardíaco crónico. Durante o seu julgamento não terminado, rejeitou advogados e auto-defendeu-se. Auto-descreveu-se como um incompreendido e o ultimo defensor de um povo orgulhoso que sofreu o que chamou de uma agressão da NATO e de terrorismo apoiado pelo Ocidente.
Milosevic foi o primeiro Chefe de Estado a enfrentar um tribunal internacional de crimes de guerra.