A Núbia Cristã caiu como fruto maduro não à força das armas, mas em resultado da penetração lenta e certa dos comerciantes árabes que finalmente colocaram no trono do monarca monofisita núbio, um príncipe convertido ao Islão em 1315. Até pelos meados do século dezasseis, o Cristianismo monofisita deixou de existir na Núbia..Dizíamos na conversa passada que o perfil militarista dos núbios era lendário por toda a parte no Mediterrâneo. A espada, a lança e a seta islâmicas, antes da pólvora faziam o temor dos núbios no Vale e mais além. Os Núbios forçaram os generais muçulmanos quando apareceram a tratar com eles os dois lados forçados a assinar um tratado de empate militar - o baqt de 652.
O mal para a Núbia foi que o pacto além do mais pautava principalmente a penetração comercial dos árabes nos territórios do sul da região nilótica. Desde logo os árabes mostraram-se mais interessados na captura de escravos para os insaciáveis mercados do Mediterrâneo.
Uma história interessantíssima esta da escravatura e cultura da cana do açúcar no Mediterrâneo onde tudo começou, e eram vendidos não só estes africanos saharianos do Vale lá dos recônditos das terras nilóticas e saharianas, mas também europeus, não apenas estes peninsulares da Itália e Hispânia, mas ainda das longínquas terras eslavas lá no interior das bacias do Reno e Danúbio terras que ficaram a ser designadas por esta sinonimia do latim da decadência – slavus - para dizer escravo terras do recrutamento de escravos por excelência hoje povos eslavos derivação esquecida na bruma dos tempos.
As experiências e sucessos com a mão de obra escrava nos canaviais das Caraíbas e das Américas séculos mais tarde tiveram os seus primeiros ensaios aqui, nas ilhas, penínsulas e margens do Mediterrâneo, Chipre, Sicília, Malaga e Algarve, do Mediterrâneo aqui da nossa história. A cana do açúcar e a mão de obra escrava foi uma história que primeiro triunfou no Mediterrâneo antes do seu esplendor nas Caraíbas e nas Américas das economias dos séculos seguintes.
O Vale do Nilo ocupado pelas forças islâmicas desde aquele século, o século catorze, surge apenas como mais um centro de recrutamento para este mesmo propósito e muito mais. Quando depois de 1315 o comércio e a penetração islâmica se consolidaram no Vale do Nilo numa relação de matéria e forma - meio e objectivo - foi uma nova frente de história que se abria na Núbia para dizer que o fim da dinastia cristã significou o fim do cristianismo como religião do estado monofisita núbio.
A Núbia Cristã perdia as suas ligações com a sua base monofisita alexandrina, no norte, onde começara, ela também a não existir há muito tempo. Instalava-se o fenómeno ”isolamento” numa altura em que o proselitismo islâmico tornava-se mais indiscreto e descarado sob a égide – agora - de um príncipe muçulmano.
Nobadia, ao norte, tornara-se islâmica; Macuria, no centro, seguia o exemplo. Apenas Alodia (ou Alwa) mais para o sul manteve-se num estado de um cristianismo vegetativo, até o seu desaparecimento lento nos meados do século dezasseis derrubado, finalmente, por uma tribo árabe beduína que vai pelo nome de Fundj que podiam ser também os Shillukes dos Grandes Lagos, fundadores do Sennar, o estado sucessor da Núbia no século dezasseis.
Os historiadores debatem. Um novo reino, uma nova página da nossa história. Esperar para ouvir. Vamos narrar. Mas antes iremos refinar uma síntese desta história da Núbia e o resto da África Nilo-sahariana. Voltaremos.