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"Estado de Selvajaria", marcado por violações dos direitos humanos, diz relatório sobre Angola


Capa do Relatório Trimestral sobre violações dos direitos humanos em algumas províncias de Angola, Movimento Cívico Mudei, 16 julho 2024
Capa do Relatório Trimestral sobre violações dos direitos humanos em algumas províncias de Angola, Movimento Cívico Mudei, 16 julho 2024

Violações dos direitos humanos pela polícia aumentaram no segundo trimestre de 2024

Um “Estado de Selvajaria” que se sobrepõe ao Estado de direito é como o Movimento Cívico Mudei classifica Angola à luz da atuação da polícia que mata sumária e impunemente, recorre habitualmente à tortura para extrair confissões a culpados e inocentes e viola sistematicamente os direitos humanos.

Relatório de Direitos humanos em Angola - 4:29
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Este quadro está descrito no "Relatório sobre violações dos direitos humanos em algumas províncias de Angola Abril – Junho 2024”, assinado pelas associações Mizangala Tu Yenu e Handela, em representação do Movimento Cívico Mudei, que será apresentado nesta quarta-feira, 17, em Luanda.

O documento a que a Voz da América teve acesso diz que “no período observado, ocorreu um agravamento em relação ao anterior, tendo-se registado execuções sumárias e uma morte derivada de tortura efetuada por agentes afetos ao Serviço de Investigação Criminal (SIC), no interior de uma esquadra da Polícia Nacional”.

“A banalização do bem jurídico ´vida´ é um indício da natureza do Estado que vigora em Angola”, continua o relatório, cujos autores lembram que “ao publicarmos o primeiro relatório sobre as violações de direitos humanos em Angola, referente ao primeiro trimestre de 2024, assumimos um compromisso de empreender os esforços necessários para manter este exercício no futuro”.

No período observado, de abril a maio, ocorreu um agravamento em relação ao anterior, diz o documento que está repleto de casos de violações dos direitos humanos por parte da polícia em Luanda, Bié e Lunda Sul.

Os casos

Um dos casos mais graves aconteceu no município do Kilambi Kiaxi, em Luanda, em maio, quando seis homens que trabalhavam numa obra foram detidos por agentes da polícia que arrombaram a porta, dispararam para o ar e, sem nunca se identificarem, os levaram para a esquadra do Palanca 2.

“As torturas incluíram pancadas com objetos como catana, martelo e taco de golfe/basebol; afogamento simulado (a chamada waterboarding); pontapés, socos, bofetadas e a infame tortura do helicóptero (ou avião), que consiste em atar os cotovelos aos tornozelos, atrás das costas, fazendo com que o peito, apoiado no chão forme um arco”, denuncia o Movimento, acrescentando que “ um desses jovens acabaria por perder a vida”.

Em Cacuaco, também em Luanda, na madrugada de 31 de maio para 1 de junho, por volta da uma da manhã, segundo testemunhas na Rua do Waco, Bairro Vidrul, Município de Cacuaco, elementos trajados com coletes do SIC e encapuzados, quebraram as lâmpadas acesas que, na falta de iluminação pública, os próprios moradores colocam nos seus muros, para que o bairro não esteja mergulhado na penumbra.

“Os agentes ameaçaram um jovem que teve a audácia de indagar o motivo daquele ato destrutivo de propriedade. Ato contínuo, invadiram o domicílio do jovem Fernando Graciano Maneco de 22 anos de idade, onde estava igualmente hospedado o seu primo, Severino Ngumbe Kussenda, nascido aos 13 de outubro de 1999 na província de Luanda, Município de Cacuaco, e António Firmino tendo extraído os três, levando-os para lugar incerto. Segundo os irmãos de Fernando e testemunhas do ato, Maurício e Isabel, ao contestar a atitude da polícia e ao perguntar para onde estavam a ser conduzidos, foram também ameaçados com arma de fogo e instruídos a entrar em casa, sem levantar ondas”, continua o documento, acrescentando que “familiares dos dois rapazes dirigiram-se ao Maria Pia, no dia 3 de junho, encontrando os corpos dos três com evidentes sinais de tortura e perfuração de balas, um dos quais, o Fernando, com um tiro que entrou pela boca e saiu pelo crânio, fcto relatado por uma tia que estava entre os membros da família que terão visto o corpo”.

O relatório também identifica casos de violência extrema aparentemente gratuita e impune, como aconteceu no Cazenga, situado ao lado do Palanca, na madrugada de 19 de Junho.

“Watucaneto Moreira “Zico”, agente do SIC, terá, embriagado, matado a tiro o vizinho, Francisco Adriano Manuel (o “Ti Chico”, de 65 anos), um sobrinho deste, José Paulo de Almeida (22 anos), e um neto, Bilson Paulo Gabriel (19 anos) que vinham de um velório”, lê-se no documento.

Há outros casos documentados no relatório que também tem nomes e fotos dos agentes da polícia.

Estado de Direito

Nas suas conclusões, o documento diz que em pleno 2024, segundo o documento, “vivemos situações de decadência social que nos obrigam a elaborar relatórios deste tipo, de forma rotineira, com o intuito de tentar chamar a atenção e frear algumas destas práticas aberrantes, responsabilizando-se os prevaricadores".

O Movimento Cívico Mudei reitera seguir na persecução de um Estado de Direito, com todos os defeitos que a ele se possam, justamente, apontar, por oposição ao permanente “Estado de Selvajaria” em que a lei escrita é letra morta.

“Almejamos um Estado onde a vida de cada pessoa seja valorizada como um bem inalienável, onde os direitos constitucionais e demais legislações em prol dos direitos humanos sejam rigorosamente respeitados. Um lugar onde os órgãos de defesa e segurança compreendam plenamente a sua missão e função: proteger, zelar pela vida e dignidade da pessoa humana, em vez de agir como criminosos, com arbitrariedade e violência”, conclui o relatório.

A Voz da América espera trazer, a qualquer momento as reações do SIC, da Polícia Nacional e do Governo.


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