Vários projectos inscritos na proposta de Orçamento Geral do Estado (OGE) em Angola, aprovada na generalidade pela Assembleia Nacional na segunda-feira,16, têm valores muito abaixo do que está ou vai ser pago pelos mesmo no sistema de ajustes directos.
Em alguns casos os preços dos contractos directos têm valores 25 vezes mais altos do que o previsto, indicam levantamentos feitos pela VOA mediante documentos oficiais.
Nas contratações simplificadas aprovadas pelo Presidente da República, João Lourenço, em Fevereiro de 2022, ainda longe do debate orçamental, os projectos surgem avaliados em 1,5 mil milhões de Kwanzas cada, cerca de dois milhões e 978 mil dólares, mas os valores do OGE apontam para 63 milhões, 787 mil e 845 Kwanzas ( USD 126.620,96) e 48 milhões, 566 mil e 756 ( USD 96.406,60), respectivamente.
A VOA pediu esclarecimentos à Presidência da República a propósito destas discrepâncias, mas sem sucesso, quando analistas questionam a propalada luta contra a corrupção e falam em má política de comunicação em matéria de adjudicações de obras do Estado sem concurso público.
Para além destas, outra discrepância está na conclusão de edifícios para departamentos ministeriais adstritos ao Governo Provincial de Benguela, nos chamados "prédios dos cubanos", que aparece na proposta orçamental também com 48 milhões, 566 mil e 756 Kwanzas (os USD 96. 406, 60), muito abaixo do valor patente nos contratos assinados pelo Chefe de Estado.
À VOA, sem entrevista gravada, o empresário chamado para este ajuste directo, Fernando Vidinha, assumiu estar alheio à proposta aprovada na generalidade pelos deputados, salientando que está a trabalhar com o orçamento de Fevereiro último, 505 milhões de Kwanzas, pouco mais de um milhão de dólares norte-americanos.
De um outro empresário, Beto Pederneira, contratado para concluir as casas nos Cabrais, onde estão as trezentas famílias vítimas das enxurradas, a VOA recebeu a confirmação, há já alguns meses, de que o orçamento seria o da contratação simplificada, o equivalente a 2.977.549,28 USD.
Perante estas discrepâncias, com orçamentos entre 25 a 30 vezes superiores, o arquitecto Felisberto Amado, um professor universitário que trabalhou no sector das Obras Públicas, diz que há demonstração de lacunas na fiscalização.
”Isso espelha que, de facto, não somos sérios, assim fica complicado combater a dita corrupção, o amiguismo, tráfico de influência e outros males”, disse.
“ Há outro problema, ninguém controla nada, o Presidente está acima de tudo”, refere, assinalando que “fica difícil percebermos o que se passa no nosso país”.
Foi nesta perspectiva, a de perceber o que se passa, que a VOA contactou o secretário do Presidente da República para os Assuntos de Comunicação Institucional e de Imprensa, Luís Fernando, que colocou o assunto na esfera do Ministério das Finanças.
Daí, do pelouro dirigido por Vera Daves, que um dia alertou para excessos nas adjudicações directas, a VOA aguarda há quase duas semanas por uma declaração da Unidade de Gestão da Dívida (UGD).
O analista Alexandre Solombe realça que há problemas de comunicação no Executivo, mesmo perante o que chama de sinais de continuidade de actos de corrupção.
“Tem legitimidade a voz que desconfia da transparência , nos projectos e no modo de alocação de recursos”, disse.
“ É tudo por amizade, mas se fala de luta contra a corrupção, então há uma repetição da cartilha desta corrupção, é isto que faz a sobrevivência do partido no poder em Angola”, acrescentou o analista.
A proposta de OGE para 2023, com receitas e despesas de pouco mais de 20 biliões de Kwanzas, vai agora receber ainda contribuições na especialidade.
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