O secretário permanente de Mocímboa da Praia, João Saraiva, apelou nesta segunda-feira, 25, a população para que espere por orientações estatais para regressar à região.
Esta posição sugere um “recuo” nos pedidos do Governo, que nos últimos meses “despachou” centenas de deslocados de Quitunda (Afungi) para aldeias de Mocímboa da Praia e Palma, distritos ainda a braços com focos de ataques terroristas em Cabo Delgado.
“As pessoas estão a regressar e nós achamos que, se calhar, elas não estão a perceber as nossas mensagens, apelando para que esperem mais um pouco”, disse João Saraiva citado pela emissora estatal, Rádio Moçambique.
O posicionamento do dirigente surge quase um mês depois das autoridades de Mocímboa da Praia terem recebido o primeiro grupo de 123 civis autorizados a regressar ao distrito, a 9 de Junho, de um grupo de cerca de 62 mil pessoas, que abandonaram a vila costeira, a maioria em 2020, quando foi tomada, por um ano, pelos rebeldes.
Em Maio, António Supeia, Secretário de Estado de Cabo Delgado vincou que o Governo estava a acelerar o plano de reconstrução da província e a criar condições para o regresso seguro da população, e ao mesmo tempo disponibilizar condições mínimas dos serviços públicos.
“Nós temos a população a regressar, e a população é a nossa razão de existência, razão pela qual estamos a dizer que devemos ser os primeiros a criar as condições, para prestar serviço à população", disse António Supeia, após anunciar o regresso de 300 funcionários públicos ao distrito de Muidumbe.
Na ocasião, citado pela Rádio Moçambique, o governante disse que regresso dos funcionários e da população ocorria na medida em que o avanço da força conjunta de Moçambique e Ruanda, e da tropa regional da África Austral, permitiu um total controlo sobre a área desabitada desde a invasão e a tomada das sedes distritais em 2020.
O governador provincial, Valige Tauabo, já tinha igualmente apelado o regresso às populações, afiançando que “a única forma para nós vencermos esta luta que estamos a travar contra o terrorismo, é nas nossas aldeias, e sermos vigilantes e denunciantes de todos aqueles que são estranhos nas nossas aldeias, em tempo útil, não denunciar muito depois”.
Novos ataques
Um ataque no final de Junho matou, pelo menos, uma pessoa e feriu outras quatro quando um grupo armado emboscou uma minibus, quase 10 quilómetros a norte da sede distrital de Mocímboa da Praia.
A carrinha de transporte fazia a ligação entre Palma e Mueda, passando por Mocímboa da Praia, na única estrada asfaltada, o que forçou a activação depois de escoltas militares no troço.
O Estado Islâmico reivindicou outro ataque a 23 de Julho, referindo ter queimado dezenas de casas, propriedades e veículos, na aldeia Mitope, no distrito de Mocímboa da Praia.
Para o analista moçambicano Wilker Dias, as recentes investidas dos grupos armados, que tem se movimentado para o sul devido a sua expulsão nalgumas áreas do norte – onde mantém ataques esporádicos e visíveis -, e o receio de infiltração dos insurgentes na população deixaram cair a propaganda do Governo sobre o regresso seguro da população.
“Por um lado, o recuo do Governo é para evitar que a população regresse de forma desenfreada para alguns pontos de Cabo Delgado, e nisto evitar infiltração dos terroristas (nas zonas libertadas) e por outro devido o reacender dos ataques em zonas” que já eram tidas como seguras, incluindo Mocímboa da Praia, disse o analista que defendeu hoje o título de mestrado, cuja tese era sobre a insurgência em Cabo Delgado.
A insurreição, com inspiração radical islâmica, irrompeu em 2017, deixando pelo menos 4.000 segundo a ACLED e cerca de 870.000 desalojados. As táticas brutais dos insurgentes- incluindo decapitações, raptos em massa, e o incêndio de aldeias inteiras – continuam a abalar a região.