O lixo é um problema de saúde pública que afecta os angolanos já há vários anos.
A reciclagem do lixo poderia gerar empregos, reduzir o impacto ambiental e contribuir para a inclusão social. No entanto, é preciso investir em estruturação de políticas para resíduos sólidos.
Vários modelos de recolha do lixo já foram implementados na província de Luanda, mas nenhum até hoje foi ambicioso o suficiente para criar uma economia circular, onde nada é desperdiçado - todos os produtos passam por reaproveitamento, transformação e reciclagem.
Em entrevista à Voz da América, o engenheiro sanitário e ambiental, José Alexandre Palanga, falou sobre a situação atual do lixo, bem como do novo modelo de recolha de Resíduos Sólidos Urbanos que entra em vigor neste mês em Luanda, cujo o qual o papel do Governo Provincial de Luanda será de supervisionar e fiscalizar o processo. As administrações municipais ficarão responsáveis pela seleção e pagamento das operadoras.
Para o engenheiro, a situação atual do lixo e dos resíduos sólidos em Luanda pode ser caracterizada como dramática e requer cuidados.
“Todos os sistemas que nós tivemos até aqui não comportavam as situações excepcionais, como foi aquela que nós vivemos no ano passado, ou seja, na eventualidade das operadoras privadas não trabalharem, como é que vai ser? O Estado está em condições para dar resposta? Os sistemas anteriores mostraram que o Estado não estava preparado”.
Vantagens do novo modelo de recolha de lixo
Segundo o engenheiro sanitário, o novo modelo de coleta de lixo aceitará a entrada de micro, pequenas e médias empresas no mercado, a fim de que possam oferecer soluções de baixo custo e ser efectivas. “Essas empresas vão estar nos bairros, nas zonas não urbanizadas,” sublinhou Palanga.
Outra vantagem é a descentralização do sistema. “A premissa de planificação do sistema sai do Governo Provincial e vai para os municípios, e é assim que deve ser feito com base na engenharia sanitária: o resíduo deve ser planificado e gerido a nível de município”. Outra vantagem citada pelo o engenheiro é que o novo modelo dá maior poder de acção e decisão para as pessoas.
“Naquelas zonas de difícil acesso, onde as pessoas têm menos poder aquisitivo, elas também vão conseguir fazer contratos com custos menores com as micro operadoras e com as associações ligadas à área de saneamento.
Desvantagens
De acordo com o engenheiro sanitário e ambiental, a principal desvantagem do novo modelo é que não está claro se vai haver alguma mudança com relação ao tratamento de resíduos sólidos. “O novo modelo não fala de reciclagem, valorização ou recolha seletiva”. Outra desvantagem é que não se sabe como as micro, pequenas e média empresas serão fiscalizadas.
“Qual é a condição em que essas empresas irão recolher os resíduos? Como vão transportar?,” indagou o engenheiro. Palanga ainda destacou que não há normas e nem legislação para a fiscalização do novo modelo de recolha do lixo. Além dessas duas desvantagens, há mais um ponto que não está claro para o engenheiro sanitário e diz respeito à capacidade de suportar esta nova demanda que os municípios terão.
“Será que não vai acontecer a mesma coisa que ocorreu no passado quando o governo ficava sem conseguir fazer o repasse de verbas para as operadoras. Isso não está claro no novo modelo”.
Ponto de vista técnico e académico sobre o novo modelo de recolha de lixo
Para o engenheiro sanitário e ambiental falta muitas respostas com o novo modelo. “Do ponto de vista operacional, acredito que pode funcionar, mas ainda assim não será uma maravilha. Nós precisamos de um modelo de gestão integrada que privilegia a economia circular. Ou seja, não podemos olhar para o lixo em Luanda somente para depositar no aterro sanitário. Temos que olhar para o lixo de Luanda como recurso. Temos que tratar o lixo privilegiando a reciclagem. Tem que olhar o lixo privilegiando a reutilização, a reintrodução do lixo como matéria-prima dos processos produtivos e este modelo não comporta isso. Eu fico meio dividido e meio cético com relação ao novo modelo. Vou só esperar para ver”.
Palanga explicou que outros profissionais também partilham dessa mesma preocupação.
“A nossa maior bandeira é que haja planos municipais de saneamento. Com base nos planos de saneamento vamos trabalhar a gestão de resíduos nos municípios, desde a planificação até a operacionalização, e que sejam um sistema digital integrado de resíduos, comporte áreas de valorização de resíduos em cada município”.
“Nós queremos que em cada município de Angola tenha uma central de valorização de resíduos. Tenha uma central de triagem. Nós queremos que cada município de Angola tenha implementado a recolha seletiva. Se nós tivermos pelo menos um modelo que já comporta esses elementos é mais fácil depois operacionalizar. Nós precisamos de um modelo ideal porque mesmo que a gente falhe na operação temos um uma linha orientadora de facto viável. É isso que nós precisamos,” concluiu o engenheiro sanitário e ambiental, José Alexandre Palanga.