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Dívidas Ocultas: Analistas dizem estar em julgamento a anterior Presidência de Moçambique


Efigénio Baptista, juiz do caso "dívidas ocultas", Maputo, Moçambique
Efigénio Baptista, juiz do caso "dívidas ocultas", Maputo, Moçambique

Há quem fale no julgamento do sistema de governação de mais de 40 anos

O julgamento do caso das “dívidas ocultas” em Moçambique vai já no seu terceiro dia e para alguns observadores começa a ficar claro que quem está a ser julgado na cadeia da Machava é a anterior Presidência de Moçambique e todo um sistema de governação do país.

Dívidas Ocultas: Analistas dizem estar em julgamento a anterior Presidência de Moçambique
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O jornalista Fernando Lima diz que não pode haver dúvidas quanto a isso e realça que é, de facto, "o anterior mandato do Presidente Guebuza que está a ser julgado, o Conselho de Estado já deu, inclusivamente, autorização a que o antigo Chefe de Estado seja ouvido porque ele era o responsável que autorizou estes empréstimos".

Lima avança que "o facto de o Presidente Nyusi, que no passado foi ministro da Defesa no Governo do Presidente Guebuza, ter dado força a que a Procuradoria-Geral da República prosseguisse com o seu processo, é apenas um pequeno detalhe neste assunto das dívidas ocultas".

O jurista Tomás Vieira Mário escreveu na sua página no Facebook que este é, certamente, "um dos maiores processos de corrupção alguma vez tramitados em África, quer pela natureza e densidade das matérias que lhe dão corpo, quer pela qualidade dos arguidos, determinada pelas suas funções no sistema de governação do país: afinal estão inclusos os responsáveis máximos dos Serviços de Informação e Segurança do Estado".

Qualidade dos arguidos

Aquele jurista destaca que, pela sua natureza, pelas condições estruturais que o permitiram, "este não é apenas um processo que vai julgar os 19 arguidos formalmente nele arrolados porque, ainda que invisíveis, com estes encontram-se várias centenas, senão mesmo milhares, de outros moçambicanos, igualmente, na qualidade de arguidos, ainda que com diferenciados graus de envolvimento e culpabilidade".

Na opinião de Vieira Mário, "um negócio de endividamento de um Estado em mais de dois mil milhões de dólares americanos não é uma operação que possa ser engendrada, desencadeada e realizada num estalar de dedos, por uma dezena de funcionários públicos, por muito altos que sejam os seus cargos, incluindo o de Presidente da República".

Por seu lado, Tomás Rondinho diz que na cadeia de máxima segurança da Machava está a ser julgado o sistema de governação de Moçambique e questiona "por que as altas figuras do Estado, ao nível presidencial, não foram arroladas para este processo".

Para Tomás Vieira Mário, a contratação destas dívidas não foi um “escândalo” isolado na trajectória política de Moçambique independente, mas representa, tão-somente, um dos mais emblemáticos momentos da trajetória de um sistema de governação, seguido por Moçambique nos últimos 30 anos.

Instrumentalização do Estado

Aquele jurista sublinha que se " trata de um sistema de governação em que o acesso e o exercício do poder de Estado têm como motivação primária a instrumentalização do próprio Estado, como meio de acesso e apropriação privada dos recursos da colectividade.

Um sistema de governação onde, na sua opinião, a coberto de fidelidades partidárias, o clientelismo e o acesso a oportunidades de diferente ordem passam por práticas que se traduzem em captura do Estado pelas elites políticas.

Ele realça ainda que, "nos nossos dias, a saga da corrida das nossas elites políticas visando a apropriação indevida dos recursos públicos, vem assumindo, por vezes, o nível de pura pilhagem".

Tomás Vieira Mário sublinha que qualquer que venha a ser o desfecho do processo – com absolvidos e condenados - "tais decisões apenas terão algum significado para a Nação se assinalarem o inicio de um processo mais longo, mais envolvente, de um debate nacional profundo, em que, sem culpados nem inocentes, procuremos, todos, resposta à seguinte pergunta: Como é que nós, moçambicanos, chegamos ao ponto de dever ao mundo, mais de dois mil milhões de dólares, de dívidas contraídas sem o nosso conhecimento e em violação da Constituição da Republica?”

Desde o dia 23 estão a ser julgados 19 arguidos acusados de terem participado no escândalo que levou à prisão na África do Sul, a pedido dos Estados Unidos, do então ministro das Finanças, Manuel Chang, que deve ser extraditado em breve para Moçambique.

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