Grande parte da crise económica de Angola é mais explicada pela falência das políticas públicas do que pela Covid-19, disse o economista angolano Josué Chilundulo, que defendeu a necessidade de uma reforma económica e de mudanças das pessoas que compõem o elenco governamental a todos os níveis.
Chilundulo falava no programa “Angola Fala Só”, da VOA, que devido, às contigências causadas pelo epidemia da Covid-19, foi feito em forma de entrevista com com algumas perguntas de ouvintes enviadas por e-mail.
O economista disse duvidar que até ao fim do ano, Angola possa ter notícias positivas sobre a sua economia.
Josué Chilundulo começou por abordar a grande queda do preço do petróleo nos mercados internacionais e fez notar que, para além disso, nos últimos seis ou sete anos a produção petrolifera tem vindo a cair algo que ele atribuiu a “uma certa arrogância do Governo de Eduardo dos Santos em que todos os canais de diálogo com o setor petrolífero acabaram por ser obstruídos”.
“Por outro lado o nível de endividamento do setor petrolífero era demasiado alto, o que gerou pontos de estrangulamento”, explicou Chilundulo, para quem isso também deve ser visto “num contexto histórico dos últimos 17 anos, em que depois da abertura do canal de financiamento por parte da China tudo o resto passou a ter menos valor”.
“O canal da China foi tão apetecível que se deixou de prestar atenção a outros canais de financiamento que seriam relevantes hoje não só no sector petrolífero “, destacou Chilundulo.
“Houve, de certa forma, atitudes que não respeitaram as regras contratuais, probidade pública e isso desmoralizou os investidores”, acrescentou.
Aquele professor de economia fez notar a desvantagem de Angola na crise económica causada pela Covid-19 por ter um sistema económico “que depende essencialmente da reação do Estado”.
“Mesmo a estrutura empresarial depende das iniciativas de consumo do Estado e da contratação de serviços”, lembrou, acrescentando que o grande prejudicado da crise será o setor das finanças publicas e, por via, dela grande parte da economia.
Para Josué Chilundulo, o nível de endividamento de Angola não dá ao Presidente João Lourenço grande campo de manobra, havendo a alternativa contudo de “olharmos para o mercado interno”.
“Mais do que desejarmos a mobilização de investimentos diretos estrangeiros é preciso recapitalizar a economia nacional e permitir que as pessoas tenham prazer em investir na economia nacional”, disse o economista.
Para isso, o Governo tem que que iniciar “mudanças radicais fora do que é politicamente correto” e das quais a recente redução do número de pastas governamentais é de apenas um por cento.
“Há que poupar dinheiro a nível da estrutura governativa para se recapitalizar a economia nacional já que os mecanismos de financiamento internacional estão comprometidos, não só por causa da dívida mas acima de tudo porque a Covid mexeu com todas as estruturas económicas e Angola não faz parte das prioridades do ponto de vista de investimentos”, disse.
“A crise que vivemos é sistémica e grande parte dos pontos de estrangulamento das falhas de mercado decorre da ineficiência governativa ou da falha de políticas públicas”, afirmou Josué Chilundulo para quem Angola “nunca teve uma agenda de governação que potenciasse os recursos locais”.
“Passe o exagero, mas Angola poderia ser um Dubai em África”, exemplificou o economista que defende uma profunda remodelação dos cargos a nivel do Estado pois “há demasiadas pessoas expostas políticamente no sector empresarial, o que obrigou o Estado a dar prioridade, por exemlo, à importação em vez da produção nacional, a ter mecanismos de financiamento da economia menos exigentes do que linhas de financiamento mais estruturadas”.
“Há um conjunto de atrasos que a Covid 19 só veio destapar”, afirmou Chilundulo, advogando que Lourenço “precisa de ter pessoas que saiam de uma zona de conforto que gera comodismos de bradar aos céus”.
“Pessoas novas e não exclusivamente em termos de idade podem desafia-lo a tomar decisões”, sublinhou Chilundulo que frisou ser "preciso retirar alguns ministros que já não se enquadram” e ainda “governadores que não se adaptam ao estilo de governação por objectivos e avaliação de resultados”.
Para o economista, a atual estrutra do Estado é um empecilho para os empresários e afirmou que em qualquer iniciativa empresarial há “uma grande densidade governativa...um conjunto de pessoas que interferem no mesmo processo a nível da administração direta”.
Assim referiu-se a ministros, secretários de Estado, governadores “e até administradores” que constituem “um conjunto de elementos distribuídos aos diferentes níveis de tomada decisão que pelo sim ou pelo não comprometem a realização de um negócio em Angola”.
Interrogado sobre a possibilidade do Estado angolano providenciar proteção social aos angolanos mais pobres, Josué Chilundulo disse que não há qualquer programa de assistência que atinja a população mais carente.
“Não temos um sistema de proteção social funcional que nos permita saber onde estão os pobres por via do qual se pode prestar assistência”, concluiu.