Quando assumir o lugar no parlamento para o qual foi eleito pela província de Benguela onde foi cabeça de lista do seu partido, Jorge Valentim já saberá se o fará como um deputado comum, ou se assumirá a vice-presidência deixada por Almerindo Jaka Jamba, recentemente nomeado embaixador de Angola na UNESCO. Porém de uma coisa Jorge Valentim está seguro. Qualquer que venha a ser o seu ""rank" , o seu desempenho no parlamento será muito diferente daquele que teve no Governo.
" Quando tomar posse no parlamento, retomar as actividades e a minha vida normal- pois neste momento ainda estou de luto- terão oportunidade de ouvir não um homem limitado pela disciplina administrativa, mas um homem de pensamentos, de convicções em relação à pátria, unidade nacional e desenvolvimento."
Valentim observa que embora o parlamento seja uma plataforma diferente, como político não tem nada a provar. Esteja no Governo, esteja num outro fórum.
"Apenas tenho que compilar as minhas memórias, e olhar positivamente para o futuro de Angola".
Por essa razão, se calhar, Valentim não esconde o desencanto resultante de insistentes insinuações que nos últimos anos o davam como estando a aproximar-se ao MPLA.
"Deixa-me repetir uma frase que disse na última reunião da Comissão Política :Uns me encontram na UNITA, outros me deixaram, e outros também hão de me deixar. Deixemos a história correr. Tanto os do MPLA como os da UNITA e os da sociedade me respeitam como um nacionalista, um antigo combatente. Acho que o país poderá respeitar o meu lugar. Tenho sentido isso.. Aqueles que ensaiaram estas coisas nos jornais, que se puseram a escrever sobre um nacionalismo que não participaram podem disparatar os que trouxeram a independência. Os nacionalistas de 1958, 1961 etc etc que lutaram pela independência quando ninguém acreditava na independência, têm que ser respeitados. Eu não tenho resposta a dar a esta gente.".
Se em relação a esta intriga Jorge Valentim já disse tudo, em relação ao mal estar que havia entre alguns quadros da UNITA que estavam no GURN, e outros com assento na direcção, ele entende que há coisas a acrescentar.
" A imprensa é que era porta-voz da posição do partido em relação aos que estavam no Governo. Havia uma espécie de campanha que não agradava a opinião pública e aqueles que estavam no Governo. Eu gostaria que os que estiveram no Governo fossem olhados com mais simpatia. A campanha dava a entender que não tinham feito nada. Pessoalmente parto do Governo com a cabeça levantada. Mas a situação está melhor , a própria UNITA tomou conta da situação. O que foi veiculado pela imprensa sobre a rotação de quadros não corresponde ao discurso que o presidente do Partido preferiu na reunião com os quadros . Não corresponde ao ambiente vivido pelos quadros do partido nessa reunião. Hoje a situação é muito melhor."
Ainda assim Jorge Valentim remete para a direcção da UNITA todas questões relativas ao fim ou não da estigmatização do partido por via da identificação de vários grupos.. grupo da mata, grupo ..da RENOVADA, grupos dos deputados que não reconheciam Manuvakola, grupo da missão externa etc etc.
"Esta pergunta dever ser colocada à direcção da UNITA no São Paulo, e aos que estavam a viver este problema. Isto não era um problema para mim. Eu estou a sair agora do Governo com cabeça levantada e com a noção de ter cumprido o seu papel, dando uma contribuição à pátria".
Apesar da abertura da reunião, há questões como o papel de cada um Parlamento, que no entender de Jorge Valentim devem ser respondidas igualmente pela direcção da UNITA.
" O senhor tem que ouvir o presidente Samakuva, em vez estar eu sempre a falar de mim próprio. Acho que pelo peso da história o partido saberá tirar proveito de mim como quiser. Eu agora sei o que o partido me garantiu, pelo que gostaria que desse também oportunidade ao presidente Samakuva, ao vice-presidente Ernesto Mulato, ou ao secretário-geral Mário Vatuva, camaradas com quem convivemos e marchamos juntos da "macoca", da macroeira, até aqui".
Se a hora é de desfazer percepções, mal entendidos, Jorge Valentim não podia ser mais preciso na descrição sobre o que pensava todos estes anos, em relação ao que era o Governo e as pessoas que lhe serviam.
" Os angolanos não se conhecem ou não se conheciam..A intelectualidade não viveu aqui lado a lado, as regiões não conviviam pacificamente... era tudo atomizado, o que teve reflexos na luta de libertação nacional. Não havia um sentimento nacional, o que se agravou com a guerra civil com a guerra. Uns foram rotulados e por ai abaixo. Acho que se criou um sentimento diferente. Não sou eu mudei de atitude em relação a outros angolanos dentro do Governo, como também outros colegas do Governo têm uma percepção diferente, não só em relação à minha pessoa, mas também em relação pessoas de outras regiões. A passagem pelo Governo foi um boa experiência que dá para concluir que pessoas de regiões diferentes podem vestir a camisola nacional. Pode se formar um núcleo que trabalha para a causa nacional."
O núcleo de que Jorge Valentim fala será eventualmente resultado da estabilização do país, e da própria UNITA. Para isto , segundo Valentim concorreu o trabalho da UNITA RENOVADA .
"Sem a RENOVADA, não haveria uma UNITA legalizada. A UNITA RENOVADA serviu de ponte para que uns atravessassem e viessem para o lado da legalidade. Isto é história. Caberá aos historiadores analisar o que seria se não houveesse vozes a mostrar que afinal se pode conviver na democracia. Repare que hoje estamos a defender teses que ontem eram tabú. Sem a RENOVADA o desfecho da guerra seria um ponto de interrogação. "
Jorge Valentim fala do desfecho da guerra sem qualquer complexo, mas recusa-se a embarcar num debate sobre a coincidência entre a morte de Jonas Savimbi e o fim do conflicto
"Eu respeito os mortos. Que ele e os que morreram descansem em paz. Se equacionar a pergunta de uma outra maneira eu responderei."
Perante a resposta de Jorge Valentim quisemos saber o que mais poderia ter feito a RENOVADA com uma UNITA dividida e num cenário de guerra.
"Ninguém acreditava que dentro da UNITA houvesse vozes capazes de serem pela paz. Não só foi com a RENOVADA que esta tese ganhou corpo, como também foi com a RENOVADA que se começou a acreditar que era possivel conviver com a UNITA, e retomar-se o protocolo de Lusaka. Noto entretanto que na histórias há vitórias totais, do tipo hitleriana, e há aquelas vitórias que fundo representam uma solução política. Mas para isto é preciso que haja negociadores, só se negoceia quando haver negociadores. Nós aparecemos como pessoas capazes de debater , negociar e encontrar uma plataforma de convivência nacional.